O jogo de futebol tem regras. Quando foram inventadas essas regras não havia campeonatos nem ligas, nem nenhum organismo que supervisionasse os jogos. Jogava quem queria, por gosto e satisfação pessoal. As regras eram cumpridas por acordo entre todos os cavalheiros que queriam jogar, e quem as ignorasse com insistência provavelmente não voltaria a jogar com os mesmos indivíduos, até se esgotarem as suas hipóteses. Aí, ou se submetia às regras do jogo, ou mudava de desporto. Provavelmente acerta altura arranjaram alguém que supervisionasse as regras de forma isenta, alguém cuja escolha fosse acordada entre todos os jogadores.
Hoje em dia o futebol tem estruturas que o gerem. Escolhem o fiscal das regras e impõem-no a quem joga e dispõem dos recursos gerados pelo trabalho dos jogadores, com o magnânimo propósito de defender e promover a modalidade. Essas estruturas até retiram e adicionam regras conforme pretendem que o jogo tenha mais ou menos golos, sempre com o superior intuito de proteger o espetáculo. Aqueles que jogam o jogo só são ouvidos através de associações que os reduzem a um grupo de pressão. O jogador, por si só, come e cala.
Consequências? As estruturas gestoras do futebol gerem o produto do esforço de indivíduos que em pouco ou nada interferem nas decisões acerca do seu uso. Anda o lucro sem dono, o que atrai pessoas dispostas a dobrar o sistema para terem maior parte do bolo. Como a estrutura depende não de decisões tomadas pelos protagonistas, mas antes por burocratas longe do campo onde o jogo se joga, torna-se fácil e apetecível corromper o sistema de forma a beneficiar qualquer um menos o jogador.
Passamos de um sistema em que o lucro gerado pelo esforço do indivíduo beneficia só o indivíduo, para um sistema em que o esforço do jogador alimenta toda uma estrutura que diz zelar pela integridade do desporto, mas que abre as portas à deterioração das virtudes da actividade.