O jogo de futebol tem regras. Quando foram inventadas essas regras não havia campeonatos nem ligas, nem nenhum organismo que supervisionasse os jogos. Jogava quem queria, por gosto e satisfação pessoal. As regras eram cumpridas por acordo entre todos os cavalheiros que queriam jogar, e quem as ignorasse com insistência provavelmente não voltaria a jogar com os mesmos indivíduos, até se esgotarem as suas hipóteses. Aí, ou se submetia às regras do jogo, ou mudava de desporto. Provavelmente acerta altura arranjaram alguém que supervisionasse as regras de forma isenta, alguém cuja escolha fosse acordada entre todos os jogadores.
Hoje em dia o futebol tem estruturas que o gerem. Escolhem o fiscal das regras e impõem-no a quem joga e dispõem dos recursos gerados pelo trabalho dos jogadores, com o magnânimo propósito de defender e promover a modalidade. Essas estruturas até retiram e adicionam regras conforme pretendem que o jogo tenha mais ou menos golos, sempre com o superior intuito de proteger o espetáculo. Aqueles que jogam o jogo só são ouvidos através de associações que os reduzem a um grupo de pressão. O jogador, por si só, come e cala.
Consequências? As estruturas gestoras do futebol gerem o produto do esforço de indivíduos que em pouco ou nada interferem nas decisões acerca do seu uso. Anda o lucro sem dono, o que atrai pessoas dispostas a dobrar o sistema para terem maior parte do bolo. Como a estrutura depende não de decisões tomadas pelos protagonistas, mas antes por burocratas longe do campo onde o jogo se joga, torna-se fácil e apetecível corromper o sistema de forma a beneficiar qualquer um menos o jogador.
Passamos de um sistema em que o lucro gerado pelo esforço do indivíduo beneficia só o indivíduo, para um sistema em que o esforço do jogador alimenta toda uma estrutura que diz zelar pela integridade do desporto, mas que abre as portas à deterioração das virtudes da actividade.
5 comentários:
O mundo do futebol implica entrar num jogo de inúmeros interesses. E neste campo o jogador é apenas mais um pião a ser jogado e usado.
Tal como o mundo do Estado que de tudo cuida (incluindo a liberdade do indivíduo) entra num jogo de inúmeros interesses, em que o comum dos cidadãos é mais um peão a ser usado a belo prazer pelos planeadores.
AH, sim. Coitadinhos dos pobres dos jogadores que só ganham mais num dia do que uma pessoa normal num ano inteiro. E depois de tanto esforço...
Em primeiro lugar, um jogador de futebol ganha o que ganha porque o mercado o permite. Tudo resto são invejas.
De resto o texto pretende ser uma alegoria ao Estado providente e peternalista, em que ninguém é dono do produto do seu trabalho, em prol do bem comum.
Tenho pena que não me tenha feito entender convenientemente.
Percebi muito bem a intenção da alegoria, só a achei infeliz.
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