Há exactamente duas semanas atrás amanheci cheio de bagagens, a caminho do aeroporto. Parei por duas horas em Amsterdão, já sozinho, na companhia, cultura e língua, e avancei para Cardiff. Cheguei ao meu destino já lá pelas cinco e meia, seis horas da tarde, levado por uma carrinha da Students Union da minha nova universidade, que disponibilizaram transporte a partir do aeroporto, para os estudantes internacionais.
Ainda só, mas não desamparado, nem perdido, formei alguns frágeis laços de cumplicidade com outros estudantes que se vêem agora obrigados a usar, no seu quotidiano, uma segunda língua. Algumas nacionalidades estão bem representadas e, para alguns, o inglês é língua materna.
Chegam a andar em bando, aqueles de nacionalidade ou língua comum, formando oásis das suas línguas e culturas onde se refugiam, às vezes em demasia, criando resistências à adapatação e antipatias. Da minha parte, encontrei um brasileiro (com nacionalidade portuguesa, também) e um alemão que viveu algum tempo em São Paulo. São eles os meus pequenos e esporádicos oásis da língua.
Por vezes dou comigo a pensar em inglês. É mais evidente quando tenho que memorizar números, como os das salas de aulas ou o meu número de inscrição, ou até mesmo o código para a entrada da residêncial. "Room D eighteen", lá me lembro eu da sala para a minha primeira aula, na próxima segunda-feira.
Mas o mais estranho aconteceu há dois dias atrás, quando me abastecia de leite para o meu pequeno almoço, na pequena loja dentro do Campus. Estava na fila para pagar, quando ouço o casal atrás de mim a falar português, tão claro quanto se fosse eu. Só não tinha a minha pronúncia madeirense, de resto... Mas o meu espanto deve-se ao facto de eu ter ignorado por completo o facto! Limitei-me a continuar a falar inglês com a senhora da caixa, e até agradeci na língua de Shakespear, quando a rapariga lusófona me levou o saco de compras de que me tinha esquecido.
Encontrei ali dois colegas mais experientes, que partilham a mesma nacionalidade e língua, mas não reagi conforme se pensa normal fazer. Porquê, não sei. Timidez, talvez. Falta de paciência na altura, quem sabe.